top of page

O impacto do Teatro de Contêiner


Paul Tolila, ao tratar da Economia da Cultura, mostra que, nas últimas décadas, os bens culturais se tornaram protagonistas no comércio global — chegando a ocupar, por exemplo, o primeiro lugar em volume de exportação dos EUA, superando setores como a agricultura e a indústria aeroespacial. Ele e outros teóricos da economia defendem que investir em cultura é investir num setor que, embora atípico à lógica econômica clássica, é estratégico no cenário contemporâneo e que por natureza se opõe ao indicador único do PIB.


Parece que em São Paulo os gestores ainda não se deram conta do impacto positivo que os espaços culturais independentes têm pra cidade. Primeiro, demoliram o Teatro Ventoforte, patrimônio cultural tombado, e agora querem demolir o Teatro de Contêiner sob a justificativa de precisarem do espaço para um hub de moradias sociais. A verdade é que o Estado segue atuando numa nova empreitada de gentrificação do centro, que passa necessariamente pela expulsão daquilo que parece não se enquadrar nessa ideia de cidade movida exclusivamente pela especulação imobiliária.


A Cidade do México pode nos dar sinais fortes do que acontece quando esse processo é levado a cabo. Por lá, a turistificação impulsionada pelos interesses privados intensificou as desigualdades sociais, afastando classes mais baixas do centro da cidade e aumentando em quatro vezes o aluguel, diante do aumento da presença de nômades digitais e turistas através de plataformas desregulamentas, como o Airbnb. Esse é o caminho que a capital paulista desenha com a desapropriação da Favela do Moinho, o suposto fim da Cracolândia e agora a expulsão de um dos principais equipamentos culturais da região.


Em oposição à essa lógica, o Teatro de Contêiner é um dos principais representantes de uma nova geração de artistas, que promove impactos econômicos, sociais, culturais e ambientais significativos com seu modo de produção. No plano econômico, ainda que não quantificada, a presença do Teatro gera circulação de público e agentes culturais, beneficiando serviços locais como comércios e pequenas iniciativas do entorno. Essa impacto é ainda mais relevante considerando a situação complexa do bairro da Luz, pois o espaço atua como catalisador de circulação de pessoas e apoio a produções independentes, movimentando a economia simbólica e, possivelmente, a economia local. Culturalmente, destaca-se como um espaço de acolhimento de coletivos periféricos, de democratização do acesso à arte e de criação de obras ligadas ao território, com protagonismo de artistas em situação de vulnerabilidade.


O impacto social é profundo: o Teatro de Contêiner atua como espaço de redução de danos, oferecendo acesso a água, banheiro e descanso para pessoas em situação de rua, estabelecendo vínculos afetivos com a comunidade do entorno e promovendo trajetórias de autonomia por meio da arte. O próprio teatro, com paredes de vidro, permite que moradores acompanhem as encenações mesmo da calçada, criando uma forma ampliada de fruição cultural e pertencimento. Além disso, há uma influencia de suas ações em instituições maiores, como o Museu da Língua Portuguesa e o Sesc Bom Retiro, que passaram a incorporar práticas mais abertas e conectadas ao território. Por fim, a opção por uma arquitetura modular, reaproveitada e de baixo impacto ambiental não apenas simboliza a resistência à lógica predatória do capital imobiliário, como também propõe um modelo de ocupação urbana mais sustentável, ética e enraizada na realidade local.


Resta claro a importância do trabalho realizado ali. Apenas da mudança de nome da Secretaria Municipal de Cultura, que incluiu a Economia Criativa, é notória a falta de conhecimento sobre o que significam os estudos realizados nesse âmbito. No caso em tela, fica explícito que parte destes gestores desconhecem a cadeia produtiva da cultura e, principalmente, que não há e nem haverá Indústrias Criativas como os Games e o Audiovisual, que tanto dizem valorizar, sem a existência dos campos de pesquisa artística e experimentação artística. O insumo da Economia Criativa é a Cultura, quando traz a abertura de referencial estético, o pensamento disruptivo e a inovação nas formas de ser e agir no mundo. Isso o Teatro de Contêiner tem de sobra e sua existência é alimento para todo o setor. Não será em mais um apartamento de 10 metros quadrados que iremos fomentar a economia do Brasil com as demandas do Século XXI.


Por ora, cabe à gestão municipal dizer se irá prosseguir na sua escolha destrutiva e simbólica contra um equipamento cultural que representa nosso avanço civilizatório em prol da redução das desigualdades ou se irá respeitar o apelo popular e, não só manter o Teatro do Contêiner onde está, mas de valorizá-lo como espaço crucial na transformação do centro. Apostar na cultura não é apenas reconhecer sua riqueza simbólica, mas também sua capacidade de estruturar novas formas de valor e competitividade, em que a produção de riqueza não se dá pelo indicador único do lucro.

 
 
 

コメント


Ecossistema Criativo Homograma

CNPJ 58.285.301/0001-99

bottom of page